Drano Rauteon
MecAut - Velas de ignição
Atualizado: 4 de jul.
De forma sucinta, uma vela de ignição é um dispositivo elétrico que se encaixa no cabeçote do cilindro num motor de combustão interna e inflama a mistura comprimida de ar/combustível por meio de uma faísca elétrica.

Imagem 1 - Velas de ignição
Mas precisamos ir além dessa simples explicação, destrinchando a história, sua evolução e detalhes de sua estrutura para compreender seu funcionamento.
As velas de ignição apareceram pela primeira vez no século XIX e pegaram os experimentos iniciais do que seria o motor de combustão interna que conhecemos hoje.
Alguns historiadores acreditam que a vela de ignição foi pensada pela primeira vez por Edmond Berger, em 1839, que tomou medidas para melhorar a eficiência dos primeiros motores de combustão interna. Também é dito que, se existisse, a vela de ignição provavelmente seria experimental, já que tal motor não foi viável até 1860. Além disso, não há patentes, registros ou relatórios que apoiem a invenção de Berger, mas ele é creditado como pioneiro.
O primeiro uso prático de uma vela de ignição elétrica foi pelo inventor belga-francês Jean Joseph Étienne Lenoir, em 1859, em seu motor a gás. Sua invenção recebeu uma patente em 13 de julho de 1886. Para ver o documento original, clique no PDF abaixo:
Sendo assim, Lenoir é geralmente creditado com a invenção da vela de ignição.
O sistema de Lenoir foi comercializado em quantidade suficiente para ser considerado o primeiro motor de combustão interna a pistão. Projetos anteriores para tais motores foram patenteados já em 1807 por De Rivaz, um inventor suíço nascido na França conhecido por inventar um motor de combustão interna movido a Hidrogênio com ignição elétrica. No entanto, nenhum deles teve sucesso comercial até que a invenção de Lenior apareceu.
CURIOSIDADE: O ACF (Automobile Club de France), em 16 de julho de 1900 concedeu a Lenoir um prêmio, que era uma placa com a inscrição: "Em reconhecimento aos seus grandes méritos como inventor do motor a gasolina e construtor do primeiro carro do mundo." E 3 semanas depois (4 de agosto), Lenoir morreu.
Vários outros inventores seguiram seu exemplo e logo ambos os lados do Atlântico tinham sujeitos construindo motores a gás. Um deles foi George Brayton, de Massachusetts, que geralmente é creditado com a invenção do primeiro motor de combustão interna norte americano.
George Brayton, em 1872 criou o motor de ciclo Brayton. Este era um propulsor de dois tempos que inicialmente usava gás vaporizado, e depois passou a usar querosene e óleo. O motor era conhecido como Brayton's Ready Motor, onde usava um cilindro para compressão, um reservatório receptor e um cilindro de potência/expansor separado no qual os produtos da combustão inflamavam/expandiam para o golpe de força. Ele também é creditado por inventar o primeiro motor comercial de combustão interna movido a combustível líquido.
CURIOSIDADE: Os motores de ciclo Brayton foram alguns dos primeiros a serem usados para força motriz. O primeiro submarino autopropulsado bem-sucedido do mundo, o Fienian Ram de John Phillip Holland em 1881, usou um motor Brayton!
Nikolaus August Otto é creditado pela criação do primeiro grande motor monocilíndrico estacionário a quatro tempos a gasolina (o motor Otto, datado de 1876), no qual a ignição da mistura ar-combustível comprimida é iniciada por uma faísca cronometrada.
O motor Otto foi o protótipo dos atuais motores de combustão interna. Seu projeto incluiu todas as 4 operações de um motor de combustão interna (admissão, compressão, potência e exaustão), que foram aplicadas a todos os motores desse tipo desde então.
CURIOSIDADE: Nicolaus Otto e Eugen Langen, filho de um industrial de açúcar, em 31 de março de 1864, lançaram a NA Otto & Cie em Colônia, Alemanha. Esta tornou-se a primeira fábrica de motores do mundo focada no design e produção de motores de combustão interna. Mais de 50.000 motores foram produzidos!
Em 16 de agosto de 1898, a patente número US609.250 foi concedida a Nikola Tesla para um ignitor elétrico para motores a gás. Para ver o documento original, clique no PDF abaixo:
Ele licenciou sua patente para Duryea, a primeira empresa norte americana a construir automóveis a gasolina. Duryea fez mudanças e melhorias e produziu uma tiragem inicial de 500 carros movidos pela ignição do sistema de Tesla.
CURIOSIDADE: As invenções de Tesla fizeram dele o inventor mais importante da América na época, mas ele morreu sem um tostão em um hotel de Nova York. Recentemente, ele foi referido como o "homem que inventou o século 20".
A patente GB 24859/1898, de Frederick Richard Simms envolvia um magneto para um motor de combustão interna. Como funciona: Um magneto é essencialmente um gerador que também gera pulsos de alta tensão nos terminais secundários quando a armadura (rotor) é girada dentro de seu campo magnético. O tempo e a duração desses pulsos determinam se eles produzem ou não uma faísca nos eletrodos da vela de ignição.
CURIOSIDADE: Você conhece as palavras "petrol" e "motorcar", certo? Mas você sabia que foi Simms quem cunhou essas palavras?
O engenheiro de Robert Bosch, Gottlob Honold, em 1901 apresentou seu sistema de ignição por magneto de alta tensão, baseado no que era conhecido como ignição por arco elétrico. Por meio de duas bobinas na armadura, gerava uma corrente de alta tensão. Esta corrente foi conduzida para uma vela de ignição por meio de uma conexão de cabo. A corrente de alta DDP saltou a lacuna entre seus eletrodos na forma de uma faísca. Além disso, o projeto de uma vela de ignição com dois eletrodos discretos era conhecido desde cerca de 1860, no entanto, todos os experimentos de ignição até então tiveram pouco sucesso.
Honold desenvolveu uma cerâmica altamente isolante para o corpo da vela e uma liga resistente ao calor para os eletrodos. Esta invenção possibilitou o desenvolvimento de um motor de ignição por faísca (motor SI). Um motor SI é um motor de combustão interna no qual as velas de ignição inflamam a mistura ar-combustível em cada cilindro. O sistema de motor SI tem sido amplamente utilizado por mais de um século desde então
CURIOSIDADE: Honold foi um inventor que experimentou sistemas de ignição de alta tensão no início do desenvolvimento de motores a gasolina. Ele trabalhou para a Bosch e é creditado por desenvolver a primeira vela de ignição de alta tensão. Com invenções que mudaram o mundo como esta, não é de admirar que a Robert Bosch GmbH tenha se tornado um gigante na indústria de peças automotivas!
Em 1899, Albert Champion, um ex-campeão francês de ciclismo que construía velas de ignição artesanais como hobby, resolveu transformar o passa-tempo em negócio e fundou a Champion Ignition Company na cidade de Boston, estado americano de Massachusetts.
Champion tinha uma vela de ignição de alta tensão em mente e decidiu encontrar uma maneira de fazê-la funcionar. Ele experimentou diferentes ligas para eletrodos e desenvolveu formas que poderiam dissipar o calor gerado por um arco elétrico durante a ignição. Ele também criou materiais de revestimento que resistiriam ao calor. Aqui estão algumas patentes de velas de ignição da Champion:
CURIOSIDADE: Entre 1899 e 1905, Albert Champion e mais dois investidores criaram a Champion Ignition Company e a Remy Electric Company. Em 1908 ele saiu da sociedade deixando o nome, para então criar a empresa AC Spark Plug em parceria com a Buick Motor Company. A AC acabou sendo adquirida pela General Motors, que também absorveu a Delco (Dayton Engineering Labs. Co., que em 1926 comprou a Remy), posteriormente (em meados de 1974), formando a mundialmente conhecida ACDelco.
Apesar disso, sistemas de ignição da Champion ainda estão presentes no mercado (não é comum no Brasil), porém, nada tem a ver com a ACDelco.
Enfim, várias patentes relacionadas a sistemas de ignição elétrica foram registradas do final da década de 1890 para frente. Os primeiros fabricantes de velas de ignição incluíam a empresa americana Champion, a empresa britânica Lodge brothers, a Bosch e a KLG (que foi pioneira no uso da Mica no corpo isolante).

Imagem 2 - A evolução das velas Bosch
Os alemães Julius Behr e Albert Ruprecht criaram a BERU, em 1912, com foco tanto em sistemas de ignição Diesel e também à gasolina. A famosíssima japonesa NGK só chegou ao mercado em 1936.
CURIOSIDADE: Para saber mais sobre a Mica e seu uso um tanto restrito, CLIQUE AQUI!
Todo este trecho sobre a história dos motores de combustão interna e velas de ignição foi feito com base em pesquisas no site "DriveSpark" e no "Mundo das Marcas".
Durante a década de 1930, a americana Helen Blair Bartlett desenvolveu um isolador à base de cerâmica de Alumina para a vela de ignição, substituindo a Porcelana e a pouco abundante Mica na construção de tais componentes. Geóloga por formação, seu conhecimento de petrologia e mineralogia foi fundamental no desenvolvimento de usos inovadores para a cerâmica de Alumina.
Passada a descrição de um pedaço da história do motor de combustão interna, vamos seguir com a estrutura e funcionamento das velas de ignição...

Optei por 'misturar' o tópico que descreve as partes do ignitor com o que descreve seu funcionamento!
Ao invés de escrever, preferi usar esta descrição:

Complemento 1 - O que as velas de ignição modernas devem suportar
Vamos começar com um diagrama da BERU:

Diagrama 1 - Como é uma vela de ignição
Terminal de conexão com o cabo de vela
Note que o terminal SAE é apenas rosqueado!

Imagem 3 - O terminal de conexão do cabo de vela é facilmente desmontável
Note que a ponte entre o terminal e o resistor interno, descrito como "pino de ignição" (Diagrama da BERU) ou genericamente "conector" (Diagrama da Bosch) parece ser uma liga de Latão. A pequena rosca para fixação do terminal SAE parece ter a mesma liga e galvanização do castelo.
CURIOSIDADE: Para conhecer melhor o Latão e outras ligas de Cobre, CLIQUE AQUI!
Corpo da vela
O corpo da vela, desde o princípio é composto por uma parte de cerâmica (isolador) e um suporte metálico para encaixe no motor (lembre-se que lá no início os flat head eram muito comuns, então o formato da vela podia ser um tanto diferente). Tal suporte metálico é mais conhecido como "castelo".
O corpo de cerâmica é sempre montado dentro do castelo, apenas com as extremidades de fora. Pó de vidro ou até mesmo pós de Sílica de Magnésio (Talco) podem ser aplicados como preenchimento após o encaixe para fazer a vedação (calafetagem) interna entre as partes, evitando fugas de gases do cilindro.

Imagem 4 - Observe o pó branco e os anéis retirados de dentro do castelo ao quebrar o isolador
Também podemos notar dois anéis metálicos de vedação entre o castelo e o isolador, junto do preenchimento com pó, mas isto depende do projeto. No caso da vela NGK da imagem acima, são dois anéis...
Veja a próxima imagem para compreender melhor:

Diagrama 2 - A estrutura de uma vela de ignição
Desde a década de 1930 que a cerâmica de Alumina é aplicada como isolador velas de ignição.

Complemento 2 - Aferindo o isolamento de velas de ignição
A Alumina é um material que pode ser bastante esbranquiçado. Ao final da linha de produção são serigrafadas incrições do fabricante na superfície do isolador. Já o castelo é uma liga de aço fundido e prensado a frio, posteriormente sendo galvanizado com Níquel e ou Cromo para aguentar corrosão.
CURIOSIDADE: Para saber mais sobre as cerâmicas e vidros utilizadas na industria automobilística e eletrônica, CLIQUE AQUI! e CLIQUE AQUI!
CURIOSIDADE: Para saber mais sobre Ligas de Aço, ligas de Ferro Fundido e um pouco sobre galvanização, CLIQUE AQUI e CLIQUE AQUI!
No momento da detonação (combustão), a temperatura é extremamente alta, mas no momento da admissão (quando entra novamente mistura ar/combustível), ocorre uma queda de temperatura no sistema, gerando constantes choques térmicos que devem ser suportados. O fascinante é imaginar como que essa variedade de materiais que formam as velas - e o motor como um todo - conseguem ter um equilíbrio de dilatação térmica para que não haja trincas.
O resistor supressor
Um resistor geralmente é implementado no interior da vela para fazer supressão de ruídos. Para saber mais sobre interferência eletromagnético, CLIQUE AQUI e leia o artigo sobre cabos de velas!

Complemento 3 - As velas "Super S" da NGK são as comuns, sem supressor. O nome 'pomposo' é apenas trabalho da equipe de merketing
OBSERVAÇÃO: Os termos "voltagem" e "amperagem" são aportuguesamentos do inglês "voltage" e "amperage" aplicados de maneira informal em diálogos no Brasil. Infelizmente tais nomenclaturas também acabam em documentos técnicos direcionados ao público geral. Quando podemos, corrigimos, e quando o erro for de nossa parte, nos corrija. Ainda bem que não aportuguesaram "wattage"... :v
Nem todos os sistemas contemplam tal resistor, como também mostra um folder da Delphi...

Tabela 1 - Existem velas com e sem supressor de EMI. No caso da Delphi há uma terceira classe "supressora de EMI para reduzir oxidação de eletrodos"
O resistor interno, como visto no diagrama da BERU é uma massa de óxidos metálicos com algum aditivo que permita condutividade elétrica, tal como negro de fumo (tipo acetileno, que é dos mais condutores). Tal resistor passa por um forno, onde adquire características vítreas.
CURIOSIDADE: Para saber mais sobre o Negro de Fumo e suas variantes, CLIQUE AQUI!
O curioso é ver que, mesmo se tratando de um jogo de velas para o mesmo motor, a resistência elétrica não é exatamente igual para todas as peças:

Imagem 5 - Velas NGK / Motorcraft 7S6G 12405 AA
CURIOSIDADE: Para saber mais sobre como funciona e a construção dos resistores, comece CLICANDO AQUI!
As velas da imagem anterior são novas e genuínas para o motor Zetec Rocam 1.0 8v, que equipou modelos da fabricante Ford até meados da metade da década passada. Pois bem, pegamos um jogo de velas usadas e paralelas para este mesmo motor e também medimos a resistência elétrica de cada uma:

Imagem 6 - Velas Bosch F000KE0P10 / HR7M+U / SP10 para o motor Zetec Rocam
Repare na discrepância de resistência entre elas e também se comparadas com as da Ford-NGK. Como não se trata de um fio resistivo, mas sim de uma massa vítrea depositada no interior do isolador, entre o pino do terminal e o eletrodo central, a resistência elétrica pode ter variações de peça pra peça:

Imagem 7 - O resistor das velas é bastante diferente daquilo que conhecemos
Dada essa disparidade na distrubuição do composto resistivo, há uma pequena diferença de resistência elétrica entre velas do mesmo modelo. De qualquer maneira, a resistividade elétrica deve geralmente estar entre 3 e 7,5 kOhm.
Eletrodos de ignição
Agora, mais um diagrama:

Diagrama 3 - Velas de ignição da Bosch tem uma construção semelhante as da Beru e NGK
Na imagem abaixo podemos notar o eletrodo central ao lado do pino terminal de um ignitor da NGK:

Imagem 8 - Lembre-se que a conexão entre os dois é feita pelo resistor!
A região dos eletrodos talvez seja a parte da vela mais robusta, já que estão em contato direto com a explosão dentro do cilindro, absorvendo um impacto e uma quantidade de calor absurda.

Imagem 9 - Folder da Delphi com seus modelos de velas. O modelo "D-Power" é apenas um trabalho da equipe do marketing
A NGK também vende um modelo cujas pontas de eletrodos são revestidas com Platina, dando o nome de "P" (tipo P). Tem as mesmas características da vela de ignição de Platina tipo GP, também da NGK. Alguns tipos possuem Cobre embutido também no eletrodo lateral, o que melhora a condução de calor.
Na próxima imagem, uma genérica descrição da Bosch sobre a construção dos eletrodos:

Imagem 10 - A Bosch destaca o eletrdo central como sendo feito em liga de Níquel-Ítrio
Note que o modelo de vela Yttrium, da Delphi, também possui eletrodo massa com friso formando um "V".
Já as velas da NGK costumam um friso "U" na ponta do eletrodo central:

Imagem 11 - O friso em "U" na ponta dos eletrodos de velas NGK
CURIOSIDADE: Seja o friso no eletrodo massa ou central, eles geralmente são descritos como "V-Groove" e "U-Groove".
Veja o folder abaixo:

Tabela 2 - Sistema de codificação das velas de ignição Delphi
Como podemos observar, existem várias ligas metálicas aplicadas nos eletrodos das velas de ignição, tudo depende da marca.
-> Nas velas Bosch nos deparamos com eletrodo central feito de liga de Cobre com ponta de liga de Níquel-Ítrio;
-> Nas velas Delphi, eletrodo central em liga de Níquel ou Cobre-Ítrio;
-> Nas velas Delphi também notamos que pode haver uma galvanização com Platina ou Irídio no eletrodo de liga de Níquel ou Cobre-Ítrio;
Já o eletrodo massa pode contemplar ligas de Níquel (mais comum) ou até mesmo Cobre galvanizado com Níquel. O Uso de Platina ou Titânio pode existir, a depender do modelo, marca e uso da vela.
Em geral, eletrodos com núcleo em liga de Cobre tendem a ter uma condutividade térmica superior, ideal para "velas frias". Você verá mais sobre este termo adiante neste texto.
CURIOSIDADE: Para saber mais sobre o Níquel e seuas diversas aplicações na indústria eletrônica e automobilística, CLIQUE AQUI!
Existem várias configurações de eletrodos para ignitores. Alguns deles podem ser vistos abaixo:

Imagem 12 - Algumas configurações de eletrodos para velas de ignição da NGK
CURIOSIDADE: A NGK também possui velas especiais para competição tipo "Racing Competition", cujas mais conhecidas são as do tipo EGV. Estas velas possuem eletrodo central de Ouro-Paládio com diâmetro de 1 mm. Possui elevado poder de dissipação de calor, maior resistência a choques mecânicos e excelente ignibilidade.
Aqui entramos no assunto "gap". O que seria isto?

Complemento 4 - O gap das velas
Observe esta folha de um manual:

Imagem 13 - Fragmento do manual de um Ford Focus MK1. Note que é definido 1 mm de distância entre eletrodos
Ao aplicar uma diferença de potencial de dezenas de kV entre os eletrodos, ocorre a ionização da mistura Ar/Combustível, isto é, a quebra da rigidez dielétrica da mistura dentro do cilindro, permitindo um fluxo de corrente entre polo negativo e positivo. Dada a potência da descarga, há uma grande transformação de energia elétrica em energia térmica e luminosa, formando a explosão. Aqui entra o efeito Joule.
Para saber mais sobre o efeito Joule, CLIQUE AQUI!
Isso explica o fato de que, se o gap for muito grande (estiver além daquilo que foi estipulado no projeto), a bobina de ignição poderá trabalhar forçada demais - pelo fato da tensão de ruptura da mistura A/C tornar-se ainda maior -, o que provocará seu superaquecimento - até mesmo dos cabos das velas - podendo criar danos irreversíveis.

Quadro de gráficos 1 - Os efeitos do desgaste e da carbonização nas velas
CURIOSIDADE: Para saber mais sobre o funcionamento das bobinas de ignição, CLIQUE AQUI!
Esta explosão, para além de calor e luz, gera energia cinética, isto é, um impacto mecânico muito forte sobre o pistão, que é empurrado para baixo. Como ele está conectado à arvore de manivelas por uma biela, esse movimento é transmitido ao eixo do motor.

GIF 1 - Como funciona uma motor quatro tempos
Essa geração de calor, luz e movimento é que torna o motor de combustão interna uma máquina térmica, um aquecedor gigante, algo nada eficiente, que pode jogar até mais de 60% da energia fora em forma de calor, que precisa ser retirado do propulsor pelo sistema de arrefecimento e dissipado na atmosfera pelo radiador. É por isso que um motor de combustão interna é rapidamente e gravemente danificado na falta de líquido arrefecedor.
O trajeto da faísca também é levado em conta. Note que na Imagem 10 é mostrado um eletrodo massa com design em "V", enquanto a BERU destaca um design "Poly-V", isto é, com o eletrodo de vários frisos, gerando cinco vias para a condução da faísca.

Complemento 5 - São várias técnicas para melhorar a eficiência dos eletrodos
Há sistemas em que o eletrodo central (positivo) possui um friso ao centro, como é o caso das velas GreenPlug (também conhecidas como "V-Power", cuja imagem já foi apresentada anteriormente), criadas pela NGK nos anos 1980 para atender uma necessidade das montadoras para adequarem-se às leis de emissões de poluentes. Neste caso, o eletrodo massa é côncavo, parecido com o "V-Groove" da Bosch e da Delphi.
Neste sistemas com frisos a centelha ocorre nas laterais dos eletrodos, formando duas vias de ignição, aumentando a energia da 'frente da chama', o que propicia uma melhor queima do combustível, reduzindo também a emissão de gases poluentes.

Imagem 14 - Vela de ignição NGK / Motorcraft 7S6G 12405 AA
As vias, independente da configuração dos eletrodos, nunca formam faísca ao mesmo tempo. É sempre uma via por vez, independente de quantas sejam. Isso dá uma melhor vida útil para o componente, já que a centelha será distribuida.
Como já foi visto, existem velas de ignição com dois ou mais eletrodos massa. Para além da melhor condutividade elétrica e condução do calor, mais de um eletrodo funciona tal como a tecnologia multivias, descrito no parágrafo anterior.

Tabela 3 - Observe que há várias configurações de eletrodos e distâncias (gaps) entre eles
Assentamento e vedação no alojamento da vela
A veja de ignição pode ter um castelo com assentamento plano e anel de vedação / dissipação térmica feito em liga de Cobre, ou então um assentamento cônico sem junta, como vemos abaixo:

Complemento 6 - Assentamento da vela em seu alojamento
Em geral, os torques aplicados são estes:

Tabela 4 - O torque geralemnte aplicado no aperto de velas de ignição
Observe a próxima tabela:

Tabela 5 - Este documento é da Delphi, porém, pode servir de referência para velas de outras marcas
No seguinte complemento, problemas que podem ocorrer pela má instalação das velas:

Complemento 7 - Excesso de torque nas velas e superaquecimento
Podemos concluir que nenhuma fabricante recomenda uma alto valor de torque para aperto, tanto pelas características da vela quanto pelo motivo dos modernos cabeçotes atuais serem feitos em liga de Alumínio, existindo o risco de espanar a rosca do alojamento.

A faixa de calor da vela de ignição é a velocidade na qual o ignitor pode transferir calor de sua extremidade localizada dentro da câmara de combustão para a estrutura do cabeçote e para o sistema de arrefecimento.

Complemento 8 - A transferência de calor numa vela de ignição
As faixas de calor das velas de ignição podem variar enormemente de vela para vela e podem ser registradas de várias maneiras diferentes, dificultando a comparação entre as marcas.
Especificamente, se a vela de ignição estiver muito quente, o motor pode sofrer pré-ignição e perda de potência. Se a vela de ignição estiver muito fria, ela não conseguirá se autolimpar adequadamente 'soltando' os depósitos de Carbono - que podem conferir algum grau de condutividade elétrica, gerando ignição fora de ponto e deterioração do componente). Portanto, escolher a faixa térmica certa é crucial para motores de alto desempenho.

Complemento 9 - Faixa de temperatura descrita pela própria NGK
Normalmente, os fabricantes de velas de ignição recomendam que a temperatura das pontas permaneça em torno de 450 a 850 °C.
Alguns sistemas de numeração de fabricantes são opostos. Para Champion, Autolite e Bosch, quanto maior o número, mais quente o ignitor. No entanto, para NGK, quanto maior o número, mais fria estará a vela.

Imagem 15 - Graduação térmica para as velas da fabricante Bosch
Cada fabricante de velas de ignição projeta a faixa de calor com um número. Normalmente, a faixa de temperatura das velas de ignição NGK varia de 2 a 11.

Tabela 6 - Graduação térmica para as velas da fabricante Delphi
Em termos gerais, os ignitores são frequentemente referidos com o termo "vela de ignição quente" ou "vela de ignição fria".
→ Uma vela de ignição quente é aquela que transfere calor lentamente da ponta dos eletrodos para o cabeçote do motor (mantendo os eletrodos mais aquecidos). A 'batida de pino' ou eletrodos centrais desintegrados são sintomas de vela de ignição muito quente.
Ignitores bastante aquecidos são bons para aplicações que operam principalmente em baixa RPM. Como eles têm um comprimento de ponta do isolador mais longo, o calor é transferido dos eletrodos para o sistema de arrefecimento em um ritmo mais lento.

Imagem 16 - Vela 'quente' e vela 'fria'
→ Uma vela de ignição fria é aquela que conduz mais calor e reduz a temperatura dos eletrodos. As velas frias são ideais para motores que trabalham em alta RPM, aplicações de indução forçada e outras instâncias em que o motor produz altas temperaturas de operação.
Em resumo:
-> Motores de baixa potência: baixa faixa de calor ou vela de ignição quente;
-> Motores de alta potência: alta faixa de calor ou vela de ignição fria.
Embora não seja tão prejudicial quanto ter um ignitor com classificação de temperatura muito baixa, os efeitos ainda podem ser prejudiciais ao motor. Se a temperatura das velas de ignição permanecer baixa, pode causar perda da faísca devido carbonização dos eletrodos, o que, por sua vez, deixará o motor falhando.
Quando a condução de calor é muito baixa, pode ser muito prejudicial para o motor, pois a vela superaquecerá, causando disparo anormal da ignição (pré-ignição), que pode levar ao derretimento dos eletrodos da vela de ignição e até mesmo erosão do pistão.
Vamos dar uma olhada no gráfico de faixa de calor, onde há informações completas sobre a graduação de algumas marcas:

Gráfico 2 - Comparação entre os padrões de graduação de cada fabricante
Alguns fatores que influenciam no funcionamento das velas:
→ Metanol: O metanol proporciona uma combustão mais completa. Com isso, pode ser necessário um ignitor frio para transferir mais calor da câmara de combustão;
→ Modificações da mistura ar/combustível: Misturas pobres de ar/combustível aumentam a temperatura de operação, juntamente com a temperatura da ponta do obturador, possivelmente causando superaquecimento ou pré-ignição. Deve se usar velas 'frias' para misturas de ar/combustível mais enxutas. Uma vez que misturas ricas de ar/combustível podem fazer com que a temperatura da vela caia, permitindo que depósitos de Carbono se acumulem na ponta, deve se usar ignitores com uma faixa de aquecimento mais alta para misturas ricas de ar/combustível;
→ Aceleração prolongada/condução em alta velocidade: A aceleração frequente e prolongada e a direção em alta rotação aumentam as temperaturas de combustão e geralmente requerem uma faixa de aquecimento mais baixa;
→ Avanço de ignição: Geralmente, o tempo de ignição avançado aumenta a temperatura da vela. De fato, a NGK estima um aumento de 70 a 100 °C para cada avanço de 10° avanço de ignição. Por causa disso, pode ser necessário usar uma vela 'fria' para evitar superaquecimento ou pré-ignição;
→ Maior taxa de compressão: Taxas de compressão mais altas significam maior pressão e temperatura no cilindro. E, novamente, pode ser necessário uma vela com faixa de aquecimento mais baixa para transferir rapidamente todo esse calor extra para o sistema de arrefecimento;
→ Sobrealimentação/turboalimentação: A indução forçada de sobrealimentação leva ao aumento da pressão e temperatura dentro do cilindro, o que pode levar à detonação da mistura a/c fora de ponto. Dependendo da aplicação, pode ser necessário usar um ignitor que drene parte do calor de maneira mais rápida.

Aqui coloco alguns detalhes que complementam o assunto principal.
Flash Over

Imagem 17 - As marcas de de uma vela que sofreu com descrga corona
O que é "Flash Over" ou "descarga corona"? Se você quiser saber mais, volte no texto e acesse o artigo sobre cabos de velas! Lá verás a explicação completa!
Óxido de Ferro na Gasolina
A presença de Óxido de Ferro, encontrado em gasolinas de baixa qualidade para aumentar a octanagem pode ser evidenciado nas velas de ignição com uma simples inspeção visual. É possível notar uma coloração que varia do marrom claro ao avermelhado, como na imagem seguinte:

Imagem 18 - Impregnação de óxido de ferro na ponta do ignitor
A NGK ressalta que uma forma de fácil identificação, é que além do isolador, o eletrodo massa e o castelo metálico também apresentam coloração vermelha quando há essa contaminação.
De qualquer forma, o Óxido de Ferro (um condutor elétrico) impregnado em toda a ponta do ignitor reduz o isolamento elétrico, permitindo que a corrente siga caminhos mais curtos para fluir de um polo pro outro, gerando perda de centelha, assim como ocorre quando há carbonização. Por ter alto ponto de fusão, nem mesmo o funcionamento do motor é capaz de promover a autolimpeza das velas.
O Ferro não é um dos componentes da gasolina produzida no Brasil e pode ter se misturado com o combustível por um processo de contaminação ou uso de aditivo não homologado. Quando ocorre por causa de aditivo, sabemos que foi algo criminoso, porém, quando é por contaminação, devemos lembrar que as carretas tanque que levam combustível até os postos muitas vezes estão sucateadas e há grande oxidação nas paredes internas dos reservatórios...

Mais uma vez, reunimos informações sobre eletrônica, mecãnica, química e CTM num só texto!
Com esta publicação, temos a tríade "bobinas / cabos / velas" no Hardware Central! E todos os textos estão relacionados com vários outros conteúdos que os complementam!
Abaixo, listo quatro PDFs que utilizei como fonte de informações para criar este conteúdo!
Se restou alguma dúvida, é só mandar um e-mail para hardwarecentrallr@gmail.com ou mande uma mensagem pelo Facebook. Se você gostou, é só curtir e compartilhar.
FONTES e CRÉDITOS
Texto: Leonardo Ritter
Imagens, Complementos, Gráficos e Diagramas: Leonardo Ritter; NGK, Bosch; BERU; Delphi Technologies; Google Imagens.
Referências: Livro "Eletrônica para Autodidatas, Estudantes e Técnicos"; Site DriveSpark; Site dos fabricantes Gauss e NGK; Documentos técnicos da Bosch, NGK, BERU e Delphi; Google Patents; Wikipedia (Somente artigos com fontes verificadas!).
Última atualização: 03 de Julho de 2023.