Achamos mais alguns modelos de placas-mãe que fogem o comum, seja por conterem armengues para implementar determinadas tecnologias ou por utilizarem tecnologias peculiares. Este texto pode ser considerado uma continuação do artigo "Arquitetura de placas-mãe de Desktop e Notebook", publicado em Outubro de 2017, aqui no HC. Para acessá-lo, CLIQUE AQUI!
A tecnologia SLI foi criada pela fabricante de placas gráficas 3DFX lá nos anos 1990. A 3DFX perdeu espaço para a concorrência e acabou sendo comprada pela nVidia, a maior fabricante de chips gráficos da atualidade. A tecnologia SLI foi aperfeiçoada pela nVidia e voltou a ser bastante utilizada em placas-mãe com interface PCI Express.
O SLI consiste em colocar dois ou mais chips gráficos para trabalharem em paralelo, aumentando a performance do PC em jogos e em outras aplicações que exigem muito processamento gráfico. O problema foi a implementação desta tecnologia na interface PCI Express. Para saber mais sobre a conexão ponto-a-ponto PCI Express, CLIQUE AQUI!
No geral, quando o chipset oferece dois ou mais conjuntos de 16 lanes cada, a implementação do SLI se torna fácil, pois cada placa de vídeo x16 é colocada em um slot PCIe x16 e se comunica com o sistema de forma individual. O problema pode acontecer quando um conjunto de lanes x16 precisa ser dividido entre duas placas de vídeo, reduzindo o desempenho. Apesar de uma placa de vídeo possuir um conector x16, ela pode funcionar em modo x8, x4 e até mesmo x1, só que a taxa de transferência fica menor, gerando um gargalo na comunicação.
Este problema de ter que dividir um conjunto de lanes entre duas placas aconteceu em alguns modelos de placa-mãe que integravam chipsets mais básicos. Como exemplo, podemos citar o chipset nVidia 650i SLI, uma versão mais completa do 650i Ultra, os dois utilizados na plataforma Intel LGA 775.
Tabela 1
O 650i Ultra possui 18 lanes PCI Express, sendo que 16 deles devem ser direcionados à um slot PCIe x16, porém uma modificação feita pela nVidia permitiu que este chipset conseguisse trabalhar com duas placas de vídeo em modo x8, daí surgiu o 650i SLI.
Apesar de algumas placas implementarem um código no firmware e CIs chaveadores que identificam uma placa em modo x16 ou duas placas em modo x8, algumas fabricantes usaram uma solução de hardware mais simples: um cartão chamado SLI Selector.
O SLI Selector possui dois conectores e, de acordo com a configuração (uma placa de vídeo em x16 ou duas placas em modo x8) o cartão deve ser conectado à placa em um slot específico para ele, que fica posicionado entre os slots PCI Express. Este cartão vai desativar o segundo slot PCI Express caso apenas uma placa de vídeo em modo x16 for conectada, ou irá dividir o conjunto de lanes caso duas placas de vídeo forem conectadas, por isso ele possui um conector marcado como "Single Vídeo Card" e outro conector marcado "Dual Vídeo Card". Abaixo, você vê a imagem de um SLI Selector montado:
Imagem 1 - Cartão SLI Selector numa placa-mãe
Outro SLI Selector pode ser visto abaixo:
Imagem 2 - Cartão SLI Selector
Perceba na Imagem 2 que não há componentes eletrônicos na PCB, apenas uma ponte que distribui 8 lanes para cada slot PCIe ou mantém 16 lanes em apenas um slot PCIe x16.
Existe um outro caso parecido com o 650i SLI envolvendo a placa-mãe DFI LANPARTY UT nF4 SLI-D, para a plataforma AMD Socket 939, que utiliza o chipset nVidia nForce4 SLI, uma modificação do nForce4 Ultra.
Tabela 2
Quando instalado duas placas de vídeo em modo SLI, um conjunto de jumpers deve ser reposicionado para que as duas placas passem à trabalhar em modo x8. Quando apenas uma placa de vídeo está instalada, os jumpers devem ser colocados na posição original para que apenas o slot da direita trabalhe em modo x16 e o da esquerda opere em modo x2. Veja a imagem desta placa da DFI abaixo:
Imagem 3 - Placa-mãe DFI LANPARTY UT nF4 SLI-D
Apesar da DFI ser parceira da nVidia, ela não fazia parte das marcas de primeiro nível (Asus, MSi e etc), então não foi convidada para o lançamento dos chipsets nForce4, e por isso não recebeu as especificações detalhadas para integrar todas as tecnologias, incluindo o SLI nesta placa, portanto este armengue de jumpers foi usado ao invés do SLI Selector.
Outra placa que utiliza um conjunto de jumpers ao invés do SLI Selector é a Gigabyte GA-M55SLI-S4, para plataforma AMD AM2. Ela também possui um chipset nVidia nForce4 SLI. Veja abaixo os jumpers e os dois modos de operação:
Diagrama 1 - Os dois modos de operação PCIe da Gigabyte GA-M55SLI-S4
Veja a imagem da Gigabyte GA-M55SLI S4 Rev. 2.0. Observe o conjunto de jumpers entre os dois slot's PCIe x16:
Imagem 4 - Gigabyte GA-M55SLI-S4
A AsRock também criou uma placa-mãe (de baixo custo, obviamente) com suporte à SLI e CrossFire, só que utilizando um chip ULi M1697 (algo estranho, pois o SLI era uma tecnologia exclusiva da nVidia naquela época). O M1697 suportava a divisão de um link x16, formando dois links x8 e permitindo a utilização de duas placas de vídeo simultaneamente. Esta placa já vinha com a gambiarra do Future CPU Port, mostrado na parte 1 da série "Placas-mãe "diferentonas", e também com um conjunto de jumpers entre os slots PCIe para ativar e desativar o SLI / CrossFire. Veja a imagem desta placa-mãe abaixo:
Imagem 5 - Placa-mãe AsRock 939SLI-eSATA2
Observe o conector Molex, o mesmo utilizado em HDDs antigos entre o slot PCIe x16 de cor branca e o slot Future CPU Port (slot de cor amarela). Esta alimentação extra serve para suprir a demanda de energia das duas placas de vídeo que poderiam ser utilizadas.
Outras placas-mãe, como por exemplo a ECS NF650iSLIT-A não possuem implementação no BIOS e nem suporte ao SLI Selector, simplesmente por que os dois slots PCIe trabalham o tempo todo em modo x8 independente se os dois estiverem em uso ou não. Isso reduz o desempenho caso for utilizado apenas uma placa de vídeo com interface x16.
Atualmente, a maioria das placas utiliza conexões PCI Express x16 ou x8 independentes para cada slot, mas mesmo assim há vários casos em que há lanes PCIe que precisam ser distribuídos em mais de dois slots (veja o caso da Asus Sabertooth 990FX mencionada abaixo), e tanto o nVidia SLI quanto o AMD CrossFire implementam chips chaveadores que, através da programação do BIOS detectam quando há apenas uma placa de vídeo x16 conectada e quando há duas ou mais placas de vídeo x16, distribuindo 8 lanes para cada uma (em alguns casos pode ser direcionado até 4 lanes). Veja estes CIs nas imagens abaixo:
Imagem 6 - Outra DFI LANPARTY e uma Asus A8N-SLI Premium, ambas com seus CIs chaveadores
Em casos como por exemplo a Asus Sabertooth 990FX, há quatro slots PCIe x16, sendo que através dos CIs chaveadores dois slots podem funcionar em modo x16, ou o primeiro slot em modo x16 e os outros dois em modo x8 (um fica desabilitado), ou todos os quatro em modo x8.
Antigamente, algumas fabricantes (na época da ATi) chegaram a implementar o mesmo SLI Selector para a tecnologia CrossFire, mas a maioria das placas utilizavam os chips chaveadores, por isso que era incomum ver placas-mãe com chipset ATi portando um SLI Selector.
Outra adaptação comum nas placas com suporte ao CrossFire era o "Cartão Terminador". Por padrão, alguns chipsets ATi tinham uma conexão x8 para cada um dos dois slots, e ao conectar apenas uma placa de vídeo era necessário instalar o raríssimo Cartão Terminador no segundo slot para redirecionar as 8 pistas para o primeiro, onde está a placa de vídeo x16. Veja a imagem abaixo para entender melhor:
Imagem 7 - Cartão terminador utilizado em algumas implementações do CrossFire
Estes foram as principais adaptações envolvendo a tecnologia SLI e CrossFire. Agora vamos para outro assunto ainda mais incomum.
Você já viu uma placa-mãe com suporte à processadores de duas marcas?
Já viu uma placa-mãe com suporte à processadores de notebook e de desktop?
Já viu uma placa-mãe com suporte à vários sockets e várias gerações de processadores? São coisas realmente incomuns.
A fabricante Elite Group Systems (ECS) criou, em meados de 2005, uma placa-mãe com suporte à processadores Intel e AMD, abrangendo os sockets AMD 754 e o 939, bem como os sockets Intel Mobile mPGA479 e o mais novo LGA775. Poderia ter surgido mais integrações, no entanto, aparentemente não foi o que o mercado quis.
Mas como ela fez tudo isso? Simples! Utilizando as mesmas técnicas de engenharia da AsRock: um slot com a mesma função do AsRock "Future CPU Port", mas com tamanho diferente e batizado de EliteBus, em que era conectado uma variedade de cartões de expansão contendo populares sockets da época.
Folder 1 - Informativo da ECS mostrando a versatilidade de sua placa
O nome desta gambiarra, digo, desta placa-mãe é "ECS PF88 Extreme Hybrid". Por padrão, a placa-mãe possuía um socket LGA775 e slots de memória DDR2. O conjunto de chipsets era o mais mixuruca possível, ou seja, uma Ponte Norte SiS 656 e uma Ponte Sul SiS 965.
Veja a imagem da placa abaixo:
Imagem 8 - ECS PF88 Extreme Hybrid
Ela não tem suporte a nVidia SLI e nem AMD CrossFire. Veja a imagem abaixo:
Imagem 9 - ECS PF88 Extreme Hybrid
Observe que esta placa-mãe também possui jumpers ao redor do EliteBus para fechar a comunicação entre a Ponte Sul SiS 965 e o cartão de expansão ou a Ponte Norte SiS 656.
Como são duas plataformas diferentes, deve haver dois BIOS, sendo uma para processadores Intel e outra para processadores AMD.
O slot PCIe x16 ligado ao EliteBus serve exclusivamente para conectar placas de vídeo que serão controladas pelo chipset Ponte Norte presente no cartão de expansão.
A interface de comunicação entre as Pontes Norte e Sul da SiS é o MuTiol, portanto, ao conectar um cartão com outro socket, este cartão também terá uma Ponte Norte da SiS para se comunicar - através do slot EliteBus - com a Ponte Sul SiS 965 da placa-mãe.
Os cartões feitos para esta placa se chamam "SIMA", abreviação para "Simply Smart Card", e o primeiro a ser lançado foi o SIMA A9S, para processadores de socket 939:
Imagem 10 - Cartão SIMA A9S
Perceba que há apenas dois slots de memória RAM DDR1 400 em dual channel, o circuito de alimentação do processador com o conector P4 e da memória RAM e um socket AMD 939.
Veja a parte de trás do cartão SIMA A9S:
Imagem 11 - Cartão SIMA A9S
Observe que além da base do Módulo de Retenção do Cooler há também um dissipador. Abaixo deste dissipador, um chip Ponte SiS 756, com PCI Express x16 Rev. 1.0 e HyperTransport 1.0.
Abaixo, veja o cartão SIMA A4S, com suporte ao socket AMD 754:
Imagem 12 - Cartão SIMA A4S
Assim como o SIMA A9S, dois slots de memória RAM DDR1 400, porém em single channel, já que o socket 754 suporta apenas um canal. Há também o circuito de alimentação dos módulos e do processador, com o conector P4, Veja abaixo a parte de trás deste cartão:
Imagem 13 - Cartão SIMA A4S
Este cartão vem com o mesmo chip Ponte SiS 756. O chipset SiS 756 esquentam muito, tanto que neste cartão há um dissipador ativo, isto é, com uma ventoinha.
Abaixo, veja o cartão SIMA I9S, feito para integrar os processadores de notebooks da época, que utilizavam o socket Intel Mobile mPGA479.
Imagem 14 - Cartão SIMA I9S
Com uma Ponte Norte SiS 649 dispondo de um canal de memória RAM DDR1 400 e um circuito de alimentação com conector P4, este foi talvez o mais curioso cartão, pois podia integrar uma CPU de notebook numa placa-mãe de computador de mesa.
Neste cartão também há jumpers para controlar "mecanicamente" a frequência do FSB, que liga o processador ao SiS 649.
O cartão SIMA A7S, provavelmente para socket AMD 462, também chegou a ser idealizado e era pra ser lançado junto do SIMA I9S, no entanto, acabou sendo só uma promessa.
O cartão SIMA I8S, com suporte ao socket mPGA478, da Intel, foi vetado dos planos da ECS, mas tudo indicou que ele seria muito parecido com o I9S para processadores Intel Mobile da época.
O cartão SIMA AMS chegou a ser idealizado, porém não foi produzido. Ele viria ao mercado com suporte à memórias DDR2 800 em dual channel e o mais novo soquete AMD AM2, que na época ainda não estava pronto.
A ideia da ECS era trazer o máximo de plataformas para trabalhar com a placa PF88, aumentando assim a compatibilidade e o custo benefício, todavia, esqueceram de um detalhe: o desempenho. O socket AM2 já viria com HyperTransport 2.0, e os chipsets da fornecedora SiS já eram de baixo desempenho, baixo custo e era questão de tempo para ficarem ainda mais defasados.
Veja como ficou este armengue montado:
Imagem 15 - ECS PF88 com um cartão SIMA montado
Veja outra imagem, da placa montada no gabinete:
Imagem 16 - PF88 montada em gabinete
Hoje poderíamos olhar para trás e ver um grande feito de uma marca de placas-mãe, que apesar de criar um produto barato, teria unificado várias e várias plataformas de duas grandes marcas. O pouco que foi feito já vai ficar para a história, pelo menos pra mim, que gostaria de ter todas as placas listadas até aqui em minha coleção!
Pra fechar o artigo, uma tecnologia que foi emporcalhada pela PC Chips durante seu último suspiro. Numa época de transição entre o barramento AGP e a conexão ponto-a-ponto PCI Express, a criatividade rolou solta em busca de fazer soluções custo-benefício. Desde Bridges PCI Express / AGP e vice-versa a até remendos como o AGPro, criado pela PC Chips.
A PC Chips já não tinha uma reputação muito boa no mercado, resolveu lançar a placa-mãe A31G, um produto muito problemático, que usava um conjunto de chipsets SiS, ou seja, juntou o ruim com o péssimo e ficou pior ainda.
Imagem 17 - PC Chips A31G e seu AGPro
CURIOSIDADE: No Linux, não havia possibilidades de se dar bem com esta placa. Os HDs SATA não eram reconhecidos e o adaptador gráfico integrado funcionava apenas em 2D, e caso o driver proprietário da SiS fosse instalado, monitores com mais de 320 linhas exibiam um borrão na parte inferior do vídeo. Os chipsets SiS eram problemas sem solução no Linux...
Voltando ao principal, esta placa suportava o socket AMD 754, que trabalhava com uma Ponte Intermediária SiS 761GX em conjunto com a Ponte Sul 965L. Havia suporte ao PCI Express x16 1.0, no entanto, não havia suporte ao barramento AGP. Com o objetivo de criar uma placa hibrida, onde placas de vídeo antigas poderiam ser instaladas no slot PCI ou AGP, e placas novas poderiam ser instaladas no recente PCI Express, a PC Chips colocou um slot AGP no barramento PCI.
Imagem 18 - AGPro, um slot AGP conectado ao barramento PCI
Como foi visto no artigo sobre o barramento AGP, ele possui um conjunto de comandos e trilhas de comunicação similar ao velho barramento PCI. Mas há um porém: a taxa de transferência das últimas versões do barramento AGP poderiam atingir 2.133 MB/s contra os 133 MB/s do PCI. Outro porém é que, apesar de ser similar ao PCI, o AGP é um barramento feito para trabalhar com apenas um dispositivo conectado, os pinos de endereço (SB_STB / SB-STB#) e outros de controle (ST [X]; RBF#; WBF#; PIPE#; entre outros) não faziam parte da interface PCI, e ainda por cima, o núcleo lógico do PCI fica na Ponte Sul, limitando ainda mais o desempenho. Estas e outras pequenas diferenças fizeram com que o AGPro fosse um grande problema.
As placas AGP já tinham suas incompatibilidades entre versões e agora teriam que funcionar com uma taxa de transferência medíocre, podendo até dividir o barramento com outras placas-filha, gerando travamentos no vídeo e até podendo não ser reconhecidas pelo sistema (problemas com driver, pois não estão conectadas à sua interface original).
Para ver mais sobre o funcionamento do barramento AGP, CLIQUE AQUI!
Para ver mais sobre o funcionamento do barramento PCI, CLIQUE AQUI!
Conhece mais alguma bizarrice no mundo da tecnologia? Mande para o Hardware Central pelo e-mail hardwarecentrallr@gmail.com ou nos contate pelo Facebook!
Gostou do artigo? Então compartilhe nas redes sociais!
FONTES e CRÉDITOS:
Texto: Leonardo Ritter
Fontes: hardware.com; AnandTech; PCSTATS; HEXUS.net; www.ecs.com; www.nvidia.com.br; Artigo sobre o barramento PCI e o AGP do Hardware Central.
Última atualização: 03 de Outubro de 2021.